As aventuras de Alice é a obra mais conhecida de Lewis Carroll e uma das mais célebres do gênero literário nonsense. A obra conta a história de uma menina chamada Alice que cai em uma toca de coelho e vai parar num lugar fantástico povoado por criaturas peculiares e antropomórficas.
A releitura e adaptação feita por Tim Burton oferece ao telespectador mais atento algumas sugestões para a explicação de importantes problemas linguísticos. Lewis Carroll não era um especialista da linguagem, por isso mesmo, o que chama a atenção são duas verdades inventadas poe ele, ambas de interesse para o estudioso da linguagem ou da semiótica.
A primeira delas é a atribuição a uma questão "linguística" do eterno desentendimento entre gatos e cachorros. O gato de Cheshire (o gato invisível) explica a Alice por que ele era louco e um cachorro, não: o cachorro rosna quando está zangado, e abana a cauda quando está contente. Mas o gato rosna (ronrona) quando está contente , e abana a cauda quando está zangado. (Lewis Carroll, Alice's Adventures in Wonderland and Though the Looking Glass. Harmondsworth, Middle-sex: Puffin Books, 1976: 88).
Em outra palavras, Lewis Carroll inventou uma belíssima explicação para a eterna briga entre cães e gatos: o "sim"em gatês quivale a um "não"em cachorrês, e vice -versa!
Lewis Carroll - e aqui vai sua segunda invenção da verdade - também questiona, com sutileza, o conceito tradicional do pronome como substituto do nome. Quando o Mosquito dentro do espelho pergunta a Alice se ela não gostaria de perder o seu nome, mas ela respone que não. E o Mosquito argumenta: se ela não tem nome, a governanta não poderia chamá- la para as lições da escola. Mas Alice responde que, embora não tivesse nome, a governata a chamaria de "senhorita" (Ididem, p. 228-9). Nessa passagem, há um questionamento a respeito do conceito de pronome. De início, Alice contradiz a definição tradicional de pronome como substituto do nome: se ela não tem nome, pode ser chamada pelo hiperônimo "menina", isto significa que "menina"também é um substituto do nome, e não se constitui num pronome.
Isso significa que, Lewis Carroll inventou a verdade de que o pronome deve ser históricamente anterior ao nome, já que se pode usar o pronome para coisas que ainda não têm nome ou para coisas cujo o nome se ignora. Se não conheço ma pessoa, pergunto a quem a conhece: "Quem é essa pessoa?". Uso dois pronomes que se tornarão desnecessários no momento em que eu aprender o nome dessa pessoa.
O Progresso da humanidade nasce mesmo é da intuição mágica das grandes sensibilidades, que faz a fama do gênio e a conquista das ciências.
(Revista Língua Portuguesa, Ano 4)